Era dia dezessete de março de mil novecentos e noventa e um e ele estava do lado de fora da sala lendo seu livro do Ayrton Senna. Eu, estava do lado de dentro esperando o momento em que conheceria o dono da voz que eu ouvia de dentro da barriga. No momento em que o vi pela primeira vez tive a certeza: Amaria aqueles olhos e seria dele o meu coração.
Algum tempo se passou, meus pais se separaram e eu fui morar com meus avós maternos. Eu não lembro muito dessa época, mas lembro que o meu pai não desistiu até que eu estivesse sobre o mesmo teto que ele novamente. Essa foi a primeira lição que ele me ensinou: Persistência.
Ele teria todos os motivos do mundo para ser ausente, morávamos
em cidades diferentes, as passagens de ônibus eram caras e o salário não se
equiparava à saudade. Mas ele sempre encontrava uma maneira me visitar e com
todas as atitudes possíveis demostrava o seu amor.
Mesmo distante ele decidiu ser o melhor, não se anulou e não
deixou ninguém fazer o que só ele sabia que poderia. Ser meu pai.
Quando eu ia passar os finais de semana na casa dele, já por
telefone pedia para eu levar todo o meu material de escola, sentava-se à mesa
comigo e revisava todos os meus cadernos para ver o que eu tinha aprendido
naquela semana. Depois, circulava de vermelho toda e qualquer palavra que eu
tivesse escrito errado e me fazia procurar no dicionário a maneira correta, então
eu reescrevia todas as palavras para uma folha em branco. Ele tinha todos os
motivos para aproveitar os finais de semana de outra forma e descansar, mas ele preferiu
me ensinar a ler e escrever respeitando todos os pontos e vírgulas. Hoje
escrevo para ele.
Meu pai foi o primeiro homem a me mandar flores, quando
fazíamos aniversário (minhas irmãs não me deixam mentir), ele comprava um buquê de flores e mandava entregar na escola, deixando minhas professoras encantadas
e as amigas enciumadas. Ele teria todos os motivos para me dar um simples
parabéns, um presente, um abraço já me faria feliz, mas ele preferiu marcar a
minha vida e ser o primeiro amor que eu poderia ter.
Em um mundo corrompido e com pessoas que acham bonito tirar
vantagem de tudo, ele me ensinou a ser honesta. Como na vez em que fomos comer, ao sair da
lanchonete ele percebeu que o moço do caixa havia entregado dez reais a mais, sem pensar duas vezes atravessou
a rua correndo e devolveu. Ele teria todos os motivos para não me falar nada
e simplesmente guardar o dinheiro, mas ele preferiu me ensinar valores que
valem mais do que notas de papel emitidas pelo banco central.
Hoje, com todas as letras e todos os parágrafos que eu puder, vou
dizer o quanto continuo amando aqueles olhos, aquela mão que segura a minha e aquele
abraço que sempre me acolheu. Com todas as lágrimas que possuo e todo amor do
meu coração vou escrever sobre a forma como ele me criou:
Longe da perfeição e perto de mim.
De todas as lições que ele me ensinou, a que ficou mais
gravada no meu peito, foi que estar presente na vida de um filho é uma decisão e
um investimento com retorno a longo prazo.
Eu jamais saberia viver em um mundo onde meu pai não existe,
mas temo que essa seja a última lição que vou ter que aprender.
Feliz dia dos pais que tinham tudo para serem ausentes, mas não conseguiram.
Feliz dia dos pais que tinham tudo para serem ausentes, mas não conseguiram.
Com amor, menina do seus olhos.
Vanessa Caetano
Um comentário:
Simplesmente lindo!!
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